POLICIAL
Ex-secretário de Casagrande recebia vantagens financeiras para proteger organização criminosa, diz MP
O Ministério Público do Estado do Espírito Santo (MPES), deflagrou hoje nesta terça-feira (12) a Operação “Decanter”, onde efetuou a a prisão do ex-secretário da Fazenda do Espírito Santo, Rogélio Pegoretti, suspeito de receber vantagens financeiras para favorecer e proteger empresários que sonegavam impostos no comércio de vinho no estado.
A investigação possui o objetivo de desarticular uma complexa organização criminosa composta por empresários, contadores, “laranjas” e agentes públicos, com atuação voltada à prática de fraudes fiscais no comércio de vinhos, em todo o Estado do Espírito Santo.
Investigações
O promotor explicou que a investigação chegou por acaso até o nome dos dois em meados de 2020, quando Pegoretti ainda era secretário, a partir de provas coletadas sobre os empresários e empresas “laranjas”.
Pegoretti ficou no cargo de janeiro de 2019 a agosto de 2021, quando sua saída foi anunciada.
“Foram várias fontes de prova, dentre elas, interceptação telefônica, e-mail, e foi a partir das análises desses dados, com quebra de sigilo bancário e fiscal, que chegamos à conclusão da fraude fiscal, que é o objetivo principal da investigação. Por um encontro fortuito, acabamos verificando essa possível participação desses dois agentes públicos”, afirmou Luis Felipe Simão.
De acordo com a Secretaria de Estado da Justiça (Sejus), o ex-secretário está no Centro de Detenção Provisória de Viana 2.
Até a última atualização deste texto, a reportagem não havia obtido contato com o preso ou a defesa dele.
Em nota, a Secretaria da Fazenda do ES disse que “aguarda o recebimento do processo a ser encaminhando pelo Ministério Público para que as devidas providências sejam tomadas”.
Disse, também, que tem “auxiliado nas investigações e reitera seu compromisso com a transparência, responsabilidade administrativa e o combate permanente a qualquer tipo de irregularidades”.
Esquema
Para adequada compreensão da fraude, é necessário ter em mente que o comércio de vinhos se sujeita à sistemática da substituição tributária “para frente”, ou seja, o fornecedor (vinícola ou importador) precisa recolher, de forma antecipada, o ICMS que presumidamente incidirá sobre todas as etapas da cadeia de circulação da mercadoria. Em aquisições interestaduais, se por algum motivo o fornecedor não realizar o recolhimento antecipado, cabe ao adquirente fazê-lo, por ocasião da entrada da mercadoria em seu estoque.
O objetivo da organização criminosa sob apuração é justamente suprimir o ICMS-ST (substituição tributária) incidente nas aquisições interestaduais. Para tanto, essas aquisições são realizadas por intermédio de empresas credenciadas para atuar em regime de substituição tributária, o que as dispensa de recolher o ICMS-ST na entrada da mercadoria. Nesse caso, o recolhimento deveria ser realizado na subsequente operação interna (venda dentro do território capixaba), entretanto, para não o fazer, os criminosos emitem notas fiscais simuladas para empresas formalmente sediadas no Estado de Goiás. Como este Estado não possui convênio com o Espírito Santo para adoção do regime de substituição tributária, essas notas são emitidas apenas com o ICMS próprio, reduzido, ainda, a apenas 1,1% do valor do produto, já que as empresas envolvidas ainda gozam de um incentivo fiscal chamado “Compete”.
Com isso, as mercadorias objeto dessas notas fiscais simuladas permanecem fisicamente em território capixaba, sendo revendidas internamente às redes varejistas com notas fiscais emitidas por outro grupo de firmas atacadistas, sem nova incidência de ICMS. Isso é possível porque estas atacadistas têm o estoque artificialmente inflado por notas simuladas emitidas por empresas “noteiras” (fictícias ou “de fachada”), as quais lançam no documento fiscal a informação de que o imposto já foi recolhido, de forma antecipada, nas operações antecedentes, o que é falso, já que a maioria das noteiras sequer possuem entradas de mercadorias registradas em seus estoques.
Prejuízo
Apenas nos últimos quatro anos, essa fraude fiscal gerou um prejuízo ao erário público estadual da ordem de R$ 120 milhões, de acordo com estimativas da Secretaria de Estado da Fazenda.
Além do enriquecimento ilícito dos integrantes da organização criminosa (os empresários sonegam em torno de 25% do ICMS devido, enquanto os contadores e intermediários responsáveis pelas operações simuladas recebem comissões em torno de 4% do valor de cada nota fiscal), o esquema vem gerando um prejuízo irreversível à livre concorrência e à economia como um todo, já que os empresários que cumprem suas obrigações tributárias não conseguem competir com os preços praticados pelos sonegadores.
Por fim, as investigações apontaram indícios substanciais de que agentes públicos receberam vantagens financeiras indevidas para resguardar os interesses dos empresários envolvidos no esquema.
Estão sendo cumpridos 7 mandados de prisão temporária, além de 24 mandados de busca e apreensão, expedidos pelo Juízo da 6ª Vara Criminal de Vila Velha. Durante o cumprimento dos mandados, foram apreendidos R$ 135.650,00 e EU$ 545 em espécie e R$ 38.944,00 em cheques.
Participam da operação 38 policiais militares da Assessoria Militar do MPES, 6 auditores fiscais da Receita Estadual, 2 promotores de Justiça do Gaesf e 4 promotores de justiça do Gaeco.
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